Banda de post-rock escocesa faz um disco com ótimas experiências incorporando elementos eletrônicos sem perder o equilíbrio
Por Lucas Scaliza
Rave Tapes foi um dos primeiros discos a ser lançado em janeiro de 2014. Mesmo antes disso, em dezembro de 2013, o novo disco do Mogwai já estava todo disponível na internet. Para quem não conhece, o Mogwai é uma banda de Glasglow e uma das precursoras do estilo conhecido como post-rock. Altamente instrumental e viajante, tentam principalmente usar os instrumentos para criar atmosferas, climas e paisagens sonoras interessantes. Embora existam solos, eles não são primordiais. E acreditem: o Mogwai sabe como qualquer boa banda de rock a fazer barulho em gravações de estúdio e soar ainda mais pulsante ao vivo.
Rock Action (2001) foi o primeiro disco dos escoceses a incluir elementos eletrônicos no som. De lá para cá, isso virou mais uma marca do som do quinteto. O ótimo The Hawking is Howling (2008) quase não tem interferência eletrônica, mas alcançou um equilíbrio invejável no incrível e barulhento Hardcore Will Never Die, But You Will (2010).
Já o nosso assunto aqui, o Rave Tapes, deixa a verve roqueira barulhenta de lado. Teclados e sintetizadores tomam a maior parte do disco com os temas principais. É uma abordagem do post-rock que agrega bem mais elementos eletrônicos, mas ainda com bastante equilíbrio, para criar climas que valorizam o espaço e não têm pressa de embalar o ouvinte. Rave Tapes, assim, é um álbum bem mais próximo da trilha sonora do seriado francês Les Revenants, que é assinada pelo Mogwai e foi lançada pelos caras em 2013 (e é ótima, tal como a série). Se o post-rock é para ser o que seu nome diz (“pós-rock”), com este disco o Mogwai não só se afasta do rock convencional como também se aproxima do chamado krautrock.
Em “Heard about you last night” temos o riff característico de guitarra enquanto um teclado vai nos embalando. Ouvidos atentos saberão que a bateria de Martin Bulloch aqui é essencial na criação do clima. Em “Simon Ferocious” temos as camadas sonoras: pelo menos duas guitarras, cada uma com a sua função melódica, e um sintetizador mantendo o ritmo reconhecível. Sem falar no baixo de Dominic Aitchison, que consegue achar seu espaço.
“Remurdered” é a primeira faixa do álbum que se apropria de forma ampla das possibilidades eletrônicas. É o melhor exemplo do kautrock do Mogwai, com os sintetizadores ganhando proeminência. Como contraste, temos as curtas “Hexon Bogon” e “Master Card”, que apostam nas guitarras com overdrive e reverb de Stuart Braithwaite e John Cummings, no baixo e na bateria para tirar sua força.
“Deesh” vai se arrastando ao criar sua música climática e um dos melhores momentos do disco. A sensação criada pelos sintetizadores e pela bateria é a de dar saltos curtos. Só ouvindo mesmo para entender. “Blues Hour”, que tem vocal, é lenta e tranquila. Cairia bem nos créditos finais de qualquer filme. “The Lord is out of control” usa novamente uma abordagem kautrock e um vocal digitalizado. Apesar de ser uma faixa lenta, há muitos ruídos e distorção ocorrendo, o que muda a impressão que se tem da canção.
Uma das características mais interessantes do Mogwai é que seu som é tão bem esculpido e produzido que é quase impossível alguém recriar suas músicas ao vivo ou em estúdio de forma idêntica à dos escoceses. Quem tenta passa alguns dias apenas encontrando as regulagens corretas para timbres, quantidades de reverb, delay e tipos de distorção. Sem falar no papel do teclado, que multiplica todas as possibilidades. E é exatamente disso que nos lembra faixas como “No medicine for regret” e “Repelish”.
Quem possui a versão japonese de Rave Tapes conta ainda com duas faixas bônus, “Bad magician 3” e “Die 1 Dislike!”, que são ótimas, com ampla participação de toda a banda e menos elementos eletrônicos.
Não é o melhor disco do Mogwai, mas com certeza acrescenta ainda mais experimentos e experiências à carreira do quinteto. Embora não seja um álbum que consiga representar toda a discografia do grupo, um ouvinte de primeira viagem poderá ter uma boa ideia do que é o post-rock dos escoceses e quem sabe se interessar por algum de seus álbuns anteriores. Eu recomendaria The Hawk is Howling e Hardcore will never die, but you will.
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